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segunda-feira, 18 de abril de 2011

ESCRITOS SINGELOS

1

Leio num dos órgãos de imprensa da terra que o Governador Chagas Rodrigues opôs veto parcial ao aumento de vencimentos do funcionalismo. Manifestou-se o Chefe do Executivo contrário a dispositivos amparadores do magistério primário, de aposentados e pensionistas, de escrivães, oficiais de justiça, proposta sua - a de elevação do chamado salário-familia.

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Ainda não conheço as razões sustentadoras do veto, mas o jornal que publicou as disposições vetadas fêz referencia a estas:

a) o Tesouro não pode suportar o aumento total do projeto votado na Assembléia.

b) a Assembléia não aprovou a proposta de Carnaque, que elevava a chamada contribuição do Desenvolvimento Econômico.

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A medida governamental atinge, como se viu, classes de funcionários humildes e hostiliza sobretudo as professoras primárias, cuja luta, iniciada em janeiro de 1960,a  política de Carnaque não pode perdoar. Meado deste ano, numa reunião com as professôras, o Sr. Chagas Rodrigues lhes fêz advertências assim:

a) a classe deveria conformar-se com a proposta de aumento saída da vontade do governante.

b) caso as mesmas procurassem sustentar a pretensão da classe com o apoio de deputados governistas, o governante vetaria a modificação.

c) se a Assembléia discordasse do veto, ainda assim as professôras não receberiam o aumento.

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Em quatro ou cinco artigos para este jornal analisei, demoradamente a mensagem e o projeto que o govêrno apelidou de projeto de aumento, mas na realidade um de reestruturação de vencimentos e de criação de cargos. Mostrei e demonstrei que o trabalho do Sr. Chagas Rodrigues e seus assessôres era prenhe de incongruências, injustiças e falhas técnicas. Feito de afogadilho, à pressa, sem estudo e meditação, estava a reclamar demorada e consciente apreciação dos deputados, que, entretanto, o aprovaram de chicote, a modo de jóqueis impacientes nas pistas de corrida de cavalos.

O Sr. Chagas Rodrigues propôs coisas absurdas a criação de advogados gerais, consultores de Secretarias de Estado, engenheiros, auxiliares de engenheiro, agrônomos, contadores - e até uma grotesca Secretaria de Imprensa (aprovada) e uma sinecura das sinecuras, do tipo daquela Secretaria de Estado Sem Pasta (derribada num minuto de reflexão) - tudo isto saiu de Carnaque, e se de Carnaque tudo isto saiu estava certo, o Sr. Chagas Rodrigues de que o Tesouro poderia arcar com as despesas respectivas.

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É certo que alguns dêsses desnecessários foram repudiados pelos legisladores. Não funcionou o rôlo compressor dos 17, com que o Chefe do Executivo tem brincado de legislar. Cada um da maioria reclamava compensações bem nutridas - e a dificuldade de levar contentamento a todos não permitiu os prêmios aos afilhados.

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O Sr. Chagas Rodrigues anulou pequenos favores concedidos, em emendas substitutivas, a classes humildes - mas sugeriu e sancionou revoltantes injustiças como aquelas de passar a 18 mil o vencimento dos seus auxiliares de confiança, que ganhavam 9 mil e quinhentos.

O novo nível de salário-família saiu de Palácio - e o Palácio é que o vetou, depois de ampla propaganda radiofônica de haver dobrado essa esmola de 50,00 cruzeiros dos filhos e da esposa do funcionário.

Leia quem tiver tempo as consignações orçamentárias de Carnaque, para uso exclusivo do Chefe de Estado em 1961 - e facilmente se compreenderá a razão de ser rico e opulento o Tesouro com o supérfluo, e avarento e ingrato não atendimento das causas justas.

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Depois de enviado o projeto do Sr. Chagas Rodrigues ao Legislativo, depois que êste o aprovou em sessões contínuas, de manhã, de tarde e de noite, Carnaque lembrou-se de verificar o total dos gastos. Atribuiu-se a tarefa ao Sr. Vidal Ferreira, que, para inicio de conversa, nos primeiros levantamentos, somou aumento de Cr$... 140,000,000,00. No projeto assinado pelo Governador se pedia um credito de apenas 80 milhões, para atender às despesas de criação de cargos e aumento mal feito, sem critério racional. Depois de aprovado com emendas supressivas e substitutivas, as despesas passaram a, talvez 160 ou 180 milhões, pois no levantamento inicial o dedicado Prof. Vidal Ferreira encontrou 140 milhões. O visto governamental, agora, esclarecido pela imprensa, ofendeu apenas algumas classes humildes. Essas classes, três ou quatro (aposentados e pensionistas, professôras primárias) e o salário-família mereceram benefícios no valor de 60 ou 80 milhões, como insinua o Governador Chagas Rodrigues? Nunca. Há gato escondido nessa história, um gato chamado Fundo de Desenvolvimento Econômico.

Sim. A contribuição do Desenvolvimento Econômico rendeu mais de 40 mil contos, neste orçamento. Ninguém fiscaliza o emprego dessa renda do Tesouro. Dela dispõe o governo, como quer.

Apesar do Anuncio persistente de que, pela primeira vez no Piauí, o Executivo aquiescia na benemerência e virtude de conceder aumento de impostos - e esta afirmação do Governador Chagas Rodrigues está na mensagem encaminhadora do Projeto - pesar disto Carnaque propôs o aumento dessa contribuição, que, conforme ao atestado do próprio nome, se destina ao desenvolvimento econômico do Estado. Mas o Legislativo não acatou o aumento proposto derribando o artigo que o propunha.

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Que providência tomou o Executivo? Vetou pequenos benefícios a aposentados e pensionistas, escrivães e oficiais de justiça, anulou qualquer aumento ao magistério primário, com o fundamento da falta de recursos, isto é, com o fundamento de que a Assembléia recusou certas mágicas carnaquianas relativas ao Fundo do Desenvolvimento Econômico, que já serve para tudo, inclusive para atendimento de despesas com funcionários públicos, inocente, destas cousas não sabia eu.

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Estou a louvar-me para estas apreciações, nos comentários de "Fôlha da Manhã", que noticiou o veto e os artigos sobre que a providência governamental recaiu, bem assim nas razões justificadoras apresentadas pelo citado órgão. Logo que me seja possível a leitura do documento oficial, poderei confirmar ou retificar estas anotações.

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Verdade é que essas leis nascidas de conluios entre dois Poderes não são leis, mas caricatura de legislação, no seu personalismo, na sua pressa injustificada, na sua desordenada compreensão.

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Reunida em 1º de junho de 1960, que fez a Assembléia nesse periodo que vai do inicio da sessão legislativa até meado de novembro? Nada ou, como tarefa, teve a de assinar a folha de pagamento. De 15 a 30 de novembro, tudo se votou, num abaixar e levantar de ancas, insensatamente, demagogicamente, numa estarrecedora simulação de cérebros e consciências.

Ressalvo a oposição, que protestou, como pôde, sem resultado.

2

Participei, 2ª feira, de uma mesa-de-debates, na Rádio Difusora, com o engenheiro Paulo Ferreira de Sousa Filho, representante da Sudene junto ao govêrno do Estado. Assunto: o problema da energia elétrica em Teresina. Notas e comentários na próxima edição.

3

É certa a reunião extraordinária da Assembléia Legislativa, em janeiro. Objetivos principais: votação de emenda à Constituição e de aumento da contribuição do Fundo do Desenvolvimento Econômico. Essa emenda constitucional visa sobretudo a revogar garantias do funcionalismo público, expressas no artigo 152. Os legisladores já aprovaram, na última sessão legislativa, em primeira discussão, a emenda, que dá ao Congresso a Faculdade de transferir e exonerar, como lhe aprouver. Nessa primeira fase, houve irregularidades, já expostas em certidão em meu poder. Numa sessão extraordinária, os legisladores pretendem aprovar em segunda e última discussão a emenda.

4

Com generosa dedicatória acabo de receber o livro "Crônicas Alegres", risonhas produções intelectuais de Oswaldo de Aguiar, escritas com simplicidade e bom gosto.

Noutra oportunidade escreverei minhas impressões a respeito da interessante e vitoriosa obra do arguto cearense.

5

Além de outras, o órgão "Estado do Piauí" edição do último domingo, estampa, como feitos ilustres, os seguintes, atribuídos ao Governador Chagas Rodrigues:

a) foi (o Governador) o primeiro que confraternizou com as fôrças sindicais nas praças e nas ruas, em comemoração ao 1º de maio.

b) foi (o Governador) o primeiro que considerou os sindicatos como entidades de utilidade pública (os sindicatos são reconhecidos pela Constituição Federal).

c) foi (o Governador) o primeiro que recebeu Presidentes de Sindicatos.

Meu Deus! Que é isto? O Sr. Chagas Rodrigues pode suportar tanto ridículo?

Na mesma relação de cometimentos gloriosos, o jornal atesta a realização de um Congresso de Camponeses, no Piauí. O primeiro. Mas onde? Quando? A Assembléia chegou, como sempre, a votar um crédito para êsse Congresso, que até o momento só existência na imaginação dos seus promotores.

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LIÇÕES DOS OUTROS

Oboé

Esta palavra oboé, do francês haut-bois, designa instrumento de sôpro, feito de madeira e como palhêta de sôpro, feito de madeira e com palhêta dupla; registro de órgão ou de harmônio.

Dela deriva o substantivo ou adjetivo comum aos dois gêneros - oboísta ou aboeista, pessoa que toca o oboé.

Oboé, que os incautos pronunciam óboe, passou ao português por caminho de Itália, onde se pronuncia oboé, como é de razão.

A pronúncia francesa é Obuá. Em espanhol a pronúncia também é oxítona, conforme ao ensinamento de Gili Gaya.


A. Tito Filho, 15/12/1960, Jornal O Dia

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